quarta-feira, 31 de julho de 2013

Tanta gente, tanto barulho, tantos passos.
E tudo tão calmo, tão distante, tão vazio.
Num canto eles brincam de pular bem alto, no outro giram, giram, giram.
Ali na frente o barco desancora, dum lado pro outro, quase que fica de pé.
E tem o que vai caracoleando em zigue-zague, sem contar o que fica de cabeça pra baixo.
Se sentem perto do céu. Estão perto do céu.
Eu tenho medo de roda-gigante, como que faço?
Medo de altura. Tenho vertigem.
Um pedaço de nuvem ou de algodão doce, moço!
Pra sonhar um tiquinho. 
Pra sorrir um tiquinho.
Pra eu ficar também perto do céu, nem que seja só o gostinho doce que fica na boca da gente. Deixa eu pensar que alcancei o azul de lá de cima.

domingo, 28 de julho de 2013

Talvez tivesse quebrado alguma lei secreta do Universo ou feito alguma coisa que fosse considerada pecado grave. Algo das encarnações passadas? Alguma, sina carma, praga, macumba das brabas? Não sabia. Mas sabia que de um jeito ou de outro, ainda que pouco se importasse ou pelo menos fingisse que não, vinha, noites sim, noites não, pegar-lhe não pelo pé, como monstro debaixo da cama vem pegar criancinhas nas histórias. Não chegava a ser um fardo que incomodasse todos os dias, se parecia mais com aqueles cortes pequenos que parece irradiar dor para todos os lados quando entra em contato com água. Uma dor que passaria despercebida, não fossem aquelas noites (e as vezes dias inteiros) que insistiam em fazer lembrar o seu destino. Quantos não dariam tudo para não sofrer por amor? Pra não sentir, não se iludir, pra não derramar rios de choro com desilusões? Mas Maria não era como as outras pessoas. Podia girar o mundo, ter uma pessoa em cada porto, mas amor, nunca iria saber o seu verdadeiro significado. Não amor propriamente dito, como aquele que temos por nossos pais, nossos, amigos, nossas coisas. Mas aquele amor que vem com a paixão, amor de se dar, de se derramar, de se jogar sem medo. Amor que todo mundo sente, do carinho, do gostar, do pensar no cheiro o dia inteiro. Maria era toda feita de momentos breves. Sua chama consumia e apagava tão rapidamente que nunca passava de um caso, de uma noite, de no máximo uma semana. E nunca entendia bem o por quê. E talvez não fosse para entender. Talvez fosse para viver intensamente os seus frames. E era isso o que Maria fazia, e o fazia bem. E não pesava sua mente por isso, não era culpa sua. Mas essa era uma daquelas noites de passar em claro. Com ou sem café, com ou sem sono, deitada na cama ou não. Os pensamentos viriam atacar sua mente, perturbar, trazer um choro sem motivo, uma agonia de vazio. Todas as músicas sem sentido pareciam ter sentido. Mas sabia que seria só por essa noite, ou pelo menos até que outras noites como essa viessem. E ainda assim, as perguntas pareciam cada vez mais distantes de uma resposta. Qual caminho teria que percorrer para um ia chegar perto de conhecer o amor? Que parafuso lhe faltou quando nasceu? Era humana oras. Sentir é o que nos faz saber que somos humanos, é o que faz com que entremos em movimento. E amor é uma das, senão a maior, provas de que sentimos. E se sentir é viver, amar é viver plenamente. Maria viveria sempre incompleta até que o amor chegue para provar o contrário? Um mundo inteiro por ai, 7 bilhões de pessoa e zero sentir. Como não achar que o problema seria com ela? Como não se encher de perguntas, como não observar cada milimetro de seus gestos, ações, corpo e até de seu modo de falar? Mas Maria era muito querida. Tinha muitos amigos, gostava de ajudar as pessoas. Maria era daquelas pessoas que nos fazem sentir bem, que exalava uma felicidade pura, sem motivos. Era feliz só por ser. Talvez esse tivesse sido o seu preço. Talvez sua sina fosse amar e se doar tanto pra vida, que a vida era sua companheira, Nasceu pra viver, pra amar a liberdade, o céu, o sol, o Universo inteiro. E nunca poderia ter um só amor. Era puro amor ela mesma. Qualquer amor menor que o amor a todas as coisas não caberia em sua forma, em sua alma. Mas nada disso importava a Maria naquelas noites. E essa era uma dessas. Queria mais é assistir um filme bobo de romance, em que todas as histórias se permeiam na mesma trama de encontro-> amor a primeira vista-> desencontro-> final feliz, ouvir músicas e procurar um sentido pra elas. E se imaginar amando, sofrendo por amor, amando de novo, e de novo, e de novo, e de novo. Assim como todas as pessoas normais.



terça-feira, 23 de julho de 2013

doses

Tudo começa com uma troca de olhares, um sorrisinho meio tímido, de canto de boca, uma conversa desajeitada, quase sempre engraçada. Um detalhe, um gesto, uma palavra bem colocada e uma boa impressão, seguida da sensação gostosa de quando a gente conhece uma pessoa legal e se sente a vontade com ela. Mais um tiquinho de conversa, passa-se a troca de mensagens e até umas ligações. Mas ai, chega o enjoo, os desencontros, os interesses que não colidem. E você que pensava que este seria diferente fica com aquele vazio que não consegue explicar. Nenhuma resposta. Dias, mais vazio, sumiço. Mais uma. Põe na conta das desilusões amorosas, garçom.







[Rápido e curto, como o texto, como as últimas experiências alheias que me chegaram aos ouvidos, como as impressões próprias dos últimos meses]

terça-feira, 9 de julho de 2013

O dia em que o tempo parou


No dia em que o tempo parou, ela não estava preparada. Não teve tempo para isso. Corria tanto rumo a seus objetivos, enfurnada em seus livros de física, cálculo e outros números infinitos que valoram x, que nem percebeu que a hora não corria e pôs-se a estudar mais e mais para a prova da semana que vem. Vitor estava vendo a 8ª temporada de uma das suas dezenas de séries favoritas, "Ainda tenho que terminar essa e mais duas da outra série épica eleita-a-melhor-de-todos-os-tempos-pela-terceira-vez-no-ano." Assistiu essa, mais outra, mais uma quarta, sexta, sétima, "nossa, como cheguei até essa daqui?" Juliana dormia após mais uma noite perdida de festas imperdíveis que todo mundo vai e eu tenho que ir. Dormia desde às 6 da manhã, e nem 48 horas seriam suficientes para recuperar as energias gastas no fim de semana inteiro. Joaquim chegara em casa após uma tarde inteira entre papéis e carimbos e outras tantas burocracias da agência de imigração em que trabalhava. Analisava passaportes cheios de viagens no mundo inteiro, "essa aqui já foi até pro Camboja, enquanto eu não sai nem da casa de meus pais". Ia fazer seu ritual de sempre: banho, tv e cama para começar o mesmo dia de todos os dias, mas dessa vez resolveu se cadastrar em um site de encontros para ver no que dá. E o tempo, por sua vez, parado. Sem horas, prazos, perspectivas ou mês que vem vou fazer isso e aquilo. E as pessoas ocupadas demais com suas rotinas, se esqueceram de atentar que as horas não passavam e o relógio não corria. 
No dia em que o tempo parou, o tempo percebeu que não era ele quem definia o fluxo das coisas e das ações. As pessoas continuavam fazendo as mesmas coisas de sempre, agindo do mesmo jeito, continuavam na corrida de seus dias e suas noites, ficando o tempo mais lento na medida de suas ansiedades e mais rápido na medida de seus desesperos. E o tempo, frente a indiferença que fazia deixar de correr ou não, desistiu de tentar ajudar os humanos e voltou a correr novamente.
Ele dividia seus dias entre a faculdade, o estágio e o trabalho noturno de garçom, vezes cantor em barzinhos mixurucas. Ralava mais que tudo para conseguir pagar o aluguel da quitinete e ainda sonhava em um dia poder tocar pra ela a música que compôs. Ela passava sempre por ele na biblioteca, com pilhas de livros, textos e papéis meio bagunçados quase saltando por dentro do classificador. Pegou seu violão e resolveu ir até a casa dela, mas foi recebido com um rude "você deveria estar estudando para a prova da semana que vem em vez de ficar passeando por ai". Foi embora, mas no meio do caminho resolveu que tentaria mais uma vez. Sabia que ela não tinha tempo, sabia que ela bateria a porta na sua cara de novo, mas resolveu não desistir. Voltou e nem deixou que ela falasse, sentou no sofá da sala e tocou os versos ensaiados incansavelmente na frente do espelho. Acabaram-se os acordes e eles se olharam em silêncio por um momento até que ele a puxou e a beijou. Beijaram-se lentamente por horas a fio, até que ele olhou o relógio com medo de estar atrasado para o trabalho e percebeu que o ponteiro continuava no mesmo lugar. Pensou que o relógio havia parado e olhou no celular, no relógio da sala, na tv, no celular dela, e todos marcavam exatamente o mesmo horário, sem um segundo a mais ou a menos. E percebeu então que o tempo havia parado.
Desse dia em diante, o tempo percebeu que a indiferença da humanidade inteira não era nada se pelo menos uma pessoa pudesse notar e aproveitar plenamente a eternidade concedida de tempo em tempo por ele. E prometeu parar toda vez que o amor ou outro sentimento suficientemente forte se fizesse presente o bastante para fazer valer cada segundo do tempo posto a disposição. 
Uso seus olhos como guia, como mosquitos gravitam em torno de lâmpadas, como faróis acesos na escuridão da noite. Uso seus olhos pra me ver como você me vê, com tanta bondade e estima, com toda aquela força que não sei de onde você tira em mim. Com o espelho de uma beleza que você me reflete, que não enxergo com meus próprios olhos e te uso para enxergar. Uso seus olhos como porto, como posto de beira de estrada quando o carro está sem gasolina, como silêncio em meio ao barulho do Universo inteiro. Uso seus olhos como gudes para brincar, como água para viver, como fonte de leveza, de doçura e desse tanto de amor que você sempre compartilhou comigo. 

sábado, 6 de julho de 2013

de encontro.

Mais um passo. O mundo inteiro passando pela sua mente, o coração sambando feito passista na Sapucaí, os olhos passeando pelos relógios alheios, o suor escorrendo pelas têmporas a terminar em uma curva na ponta do queixo, pingando na gola polo da camisa rosê, escolhida dentre a pilha de roupa que restou largada em cima da cama. Devia estar perfeita, sem parecer que fez algum esforço ou se arrumou algum tanto para aquele momento. Chegavam e saiam pessoas entre os portões, entre chamadas, lágrimas, atrasos e esbarrões em malas mal dispostas no chão cinza, frio e liso. Fazia pouco sol, mas o calor parecia aumentar, junto com a respiração, a ansiedade e o medo. O medo de não reconhecer, o medo de sentir, o medo de não sentir. O medo de quem guarda por tanto tempo um brinquedo e quando vai brincar não tem mais graça ou alguma peça se perdeu. 365 dias sibilavam em sua boca, trezentos-e-sessenta-e-cinco-dias contados no calendário, nos dedos, nos lembretes e feriados. Presença ausente em todas as horas dos dias tediosos e chuvosos em que assistir televisão por uma tarde inteira parecia um fardo insuportável em sua vida de estudar, trabalhar e passar a madrugada esperando Alexandre se entender com a mudança do fuso horário e vir dar as caras às 2 da manhã. Tantas coisas que precisava contar, tantos conselhos que esperaram para ser dados e se perderam na confusão da distância, tanta saudade para matar que nem sabia se isso seria possível ao menos que passassem o próximo ano inteiro grudados como figurinha. 16:41. "Pela centésima vez moça, a previsão é que chegue às 17:00 horas." Os minutos pareciam brigar com o seu cérebro, já havia tomado 3 cappuccinos, checado o celular umas 10 vezes, ligado pra Ana e Carol, revisado todas as frases no espelho do banheiro, retocado o batom e o corretivo outras tantas vezes. Não era um simples oi, tudo bem? Era toda uma história que se passava, um tanto de mentiras que podem ter sido contadas, várias indagações, suposições, e-se-ele-conheceu-alguém?. Como poder prever o que se passou dentro dele nesse ano, nessa nova experiência. Austrália não é só o outro lado do mundo. É um mundo inteiro passado entre dois que achavam que seriam sempre o mundo um do outro. 16:55. Apenas 5 minutos separavam a expectativa e a possibilidade de um futuro. Suava mais ainda e resolveu trocar de blusa. É, tinha pensado em todas as possibilidades. Soltou o cabelo, o prendeu e soltou de novo. Conferiu todos os detalhes, repassou as frases no espelho, retocou o batom, perguntou as horas pras duas senhoras que entraram no banheiro e conferiu no celular para ver se não estavam atrasados. 17:00 horas. Pelo vidro podia ver os passageiros descendo do avião. Alguns apressados, outros calmos. E ele. Com seus cabelos lisos meio desgrenhados, com uma barba por fazer, com um charme que não podia ser explicado apenas pelas cores do sol indo embora no horizonte. Ah, estava sem graça, deveria ter vindo com outra blusa, mas agora já era tarde. Dirigiu-se ao portão de desembarque. E seus olhares cruzaram-se, terminando em um longo e confortante abraço que não podia definir-se. Apenas o tempo sanaria o tempo que passou e construiria o tempo que há de vir. Mas dentro do coração ela sabia todas as respostas.





PS: Não sei a resposta do coração dela. Talvez renda um outro texto cujo conteúdo ainda me é desconhecido. :)